sábado, 14 de junho de 2014

A Máscara e o Véu, de Laéria Fontenele


Olá, pessoal! Aqui estou novamente com mais uma dica para aqueles que se deleitam com a poesia adeliana. Sou daqueles que preferem ler Adélia por deleite e fruição, mas confesso, tenho certo gosto pela pesquisa, talvez seja influência dos tempos da faculdade. Desta vez, trago para vocês um excelente livro sobre o discurso adeliano. Se chama A Máscara e o Véu: o discurso feminino e a escritura de Adélia Prado (2002), escrito pela professora Laéria Fontenele. Aproveitem o máximo, só não deixem de ler a Adélia no original. Até a próxima!

INTRODUÇÃO 
A eleição de um objeto a que se pretende dar um tratamento analítico obedece, provavelmente, a um ponto de mutismo que, dificilmente, pode ser determinado com precisão, – sem, com isso, mobilizar os fantasmas da ciência e seus consequentes núcleos, que, por atualizarem o enigma das origens, requerem o tratamento simbólico. Por isso, traçam-se, nesta introdução, apenas os momentos em que se ornaram explicitas as razões pelas quais o objeto desta investigação tornou-se inteligível e digno de um percurso. 
As obras literárias, (assim como as científicas e culturais) raramente, impõem-se ao leitor por si mesmas. Em geral, inauguram-se a partir dos discursos que mobilizam em torno de si: "La critica desdobla los sentidos, hace flotar un segundo lenguaje por encima del primer lenguaje de la obra, es decir, una coherencia de signos (Barthes, 1996: 66) 
O crítico - figura que, em suas origens, segundo Foucault, (2000: 156) seria o agente da crítica enquanto "uma instituição judicativa, hierarquizante, mediadora entre uma linguagem criadora, um autor criador e um publico de simples consumidores" - exerce a função social de oferecer ao leitor uma pré-leitura da obra, como se esta somente fosse acessível àquele a partir dessa mediação. Em nosso tempo, ainda de acordo com Foucault, o crítico faz de seu trabalho não o produto de seu gosto e de sua intenção judicativa; escolhe, ao invés disso, a priori, um método de análise, através do qual estabelece uma rede discursiva, pretensamente objetiva e que gera a "multiplicação dos atos críticos" (p. 155) 
Assim, a obra se distancia, também, do crítico, pois tal procedimento funda um novo mediador entre ela e o analista: a teoria pela qual, agora, ela, a obra, a ele pode ter acessibilidade. De qualquer forma, o leitor continua chegando a obra pelo processo mediador da critica, - embora, segundo essa ordem, trate-se de uma dupla mediação. Esclarece-se, com isso, que a escritura de Adélia Prado, a princípio, aportou nesta leitura a partir de sua dependência a essa rede de discursividades. 
Nisso, uma serie de juízos, já construídos pela receptividade da crítica à sua obra foi imposta a esta análise, antes mesmo de se ter acesso à sua letra: Adélia, a escritora mineira, a dama de Divinópolis, mulher madura que lança seu primeiro livro aos 41 anos; poetisa do cotidiano feminino; a voz mais feminina da poesia brasileira contemporânea; escritora que imprime, em sua obra, a sua experiencia de mulher; a apadrinhada de Carlos Drummond de Andrade; a escritora que se impôs sem jamais haver se radicado nas metrópoles culturais... (Enumerar-se-ia, ainda, uma gama de outros predicados a ela atribuídos, e que circulam socialmente, oferecendo ao leitor a opção de tomá-la, num primeiro momento, a partir de um deles, de todos ou, ainda, de sua síntese.) 
Depois, a aproximação de sua escrita e a materialidade de sua letra provocaram indagações sobre a possibilidade desses diversos rótulos estarem ou não legitimados por sua escritura; o que, per certo, obedeceu a um processo de delimitação, segundo a qual foi possível a explicitação do objectivo deste estudo. Constatou-se a necessidade prévia da indagação acerca dos modos constitutivos do surgimento de um tipo de discurso analítico que elegeu o problema do "feminino" na literatura como o seu objeto, bem como a sua potencia em gerar toda uma rede discursiva sobre o assunto. 
A partir de tal procedimento, fez-se imperiosa a pergunta sobre a especificidade das marcas literárias desse modo de escrita e, também, como Adélia Prado delas se serve. Visou-se, com isso, a compreensão da associação de sua escrita ao "'feminino" na literatura. 
Este estudo abordará as razões pelas quais a escritura de Adélia Prado transcende tal classificação. Serão traçadas, portanto, as condições por que Adélia Prado constrói o seu crono-topo, considerando-se a especificidade como o sujeito lírico e/ ou ficcional se desloca no espaço e como estabelece a relação com a extensão temporal. Cuidará, assim, da construção da singularidade poética de Adélia Prado, enquanto produtora de um estilo que a insere no campo literário como função de autoria: ou seja, reveladora de aspectos originais, que podem ser associados ao seu nome e diferenciá-la de outros autores, no sentido de trabalhar, de forma específica, as regras do literário do campo em que se encontra inserida. 

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